Beth Carvalho, uma ano sem a Madrinha do Samba

No dia em que completa um ano sem Beth Carvalho, 30 de abril, o Canal BIS exibe um documentário exclusivo sobre a vida e a carreira de uma das maiores artistas do gênero, considerada a Madrinha do Samba por revelar gerações de novos sambistas, entre os quais Zeca Pagodinho. O documentário “Beth Carvalho”, que também estará disponível no BIS Play, vai ao ar a partir das 22h. Mesclando depoimentos da própria cantora e de convidados, como Martinho da Vila, Roberto Menescal e Arlindo Cruz, o filme traça o início de sua trajetória e relembra algumas performances memoráveis.

Nascida no berço do samba, no bairro da Gamboa, zona portuária do Rio, Beth chegou aonde nenhum sambista  jamais sonhou: o espaço sideral. Em 1997, sua interpretação para “Coisinha do Pai”, de Jorge Aragão, foi escolhida pela Nasa para “acordar” o robô Sojourner, enviado em missão à Marte.

Em artigo publicado, por ocasião de sua morte, o jornalista e pesquisador do samba Fred Soares destaca que a artista já bebia na fonte do samba desde os anos 1960, quando iniciou sua trajetória como cantora. “Foi no começo dos 1970 que ela ganhou notoriedade depois de se destacar em dois festivais de música, em que fez de ‘Caminhada’ e ‘Andança’ sucessos cantados até hoje. Canções românticas, mas que lhe serviram como trampolim para que começasse a se realizar como sambista. A fama conquistada na TV permitiu que ela chegasse às rodas de samba não mais apenas como uma admiradora. Pelas mãos do ex-jogador e técnico do Vasco Acyr Portela, atravessou o Túnel Rebouças e foi garimpar novos talentos nos terreiros do subúrbio. Graças a seu ouvido apurado e olhar certeiro, trouxe para perto de si jovens até então desconhecidos e passou a gravar seu repertório. Entres eles, Zeca Pagodinho, Jorge Aragão, Luiz Carlos da Vila, Almir Guineto e Arlindo Cruz. O reconhecimento veio numa alcunha, da qual ela sempre se orgulhou: Madrinha”, descreve Fred Soares.

Beth com uma das suas referências musicais, Nelson Cavaquinho (à esquerda, Guilherme de Brito e, à direita, Arlindo Cruz)
Beth, nos anos 1970, com Nelson Cavaquinho (à esquerda, Guilherme de Brito e, à direita, Arlindo Cruz) – Foto: Reprodução

Ao longo de sua carreira, Beth fez gravações históricas com diversos mestres do samba, como Nelson Cavaquinho, Cartola, Nelson Sargento e Carlos Cachaça. Em 2009, Beth foi homenageada no Grammy Latino, em Las Vegas. Na ocasião, a cantora foi a primeira sambista a receber um dos mais importantes prêmios da cerimônia, o Lifetime Achievement Awards. Mais além de toda sua consagração no constelação do samba e da música popular brasileira, esta mangueirense e botafoguense fervorosa, era desde a juventude uma combativa militante política. Foi uma das artistas mais atuantes nas grandes campanhas cívicas pela redemocratização do país, tais como pela Anistia, em 1979, e as Diretas Já, em 1984.

Beth Carvalho condecorou o líder cubano Fidel Castro, visita ao Rio de Janeiro - Foto: Reprodução
Beth Carvalho condecorou o líder cubano Fidel Castro, visita ao Rio de Janeiro – Foto: Reprodução

Beth foi uma das primeiras artistas a furar o cerco da censura ao gravar, em 1981, o samba “Virada”, uma crítica direta e sem subterfúgios à carestia e hiperinflação que afetava as camadas mais pobres da população. “O que adianta eu trabalhar demais / Se o que eu ganho é pouco / Se cada dia eu vou mais pra trás, /Nessa vida levando soco, / E quem tem muito tá querendo mais, / E quem não tem tá no sufoco, / Vamos lá rapaziada, / Tá na hora da virada, / Vamos dar o troco”, cantou Beth nos primeiros versos da canção que logo caiu na boca do povo e tornou-se um de seus maiores sucessos. Seu autor era Noca da Portela, sambista filiado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), que, graças ao que ganhou de direitos autorais conseguiu, enfim, comprar sua casa própria no subúrbio de Engenho de Dentro, onde vive até hoje. Mais uma vez, Beth foi madrinha. Durante uma visita de Fidel Castro ao Rio de Janeiro, durante o governo Leonel Brizola, foi Beth foi quem entregou ao líder cubano a medalha da Ordem Tiradentes, a mais alta honraria do Estado.  Até os últimos dias, foi combativa militantes das boas causas de nosso povo. Pois era uma legítima artista do povo com legitimidade para falar em seu nome tanto num palco quanto num palanque. Seu sucesso comprova isso. Assista, abaixo, uma apresentação histórica da Madrinha no Parque de Madureira:

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