Paulinho da Viola em dois atos (e um tributo)

Paulinho da Viola

Elegância no samba tem nome, sobrenome e cor de fundo. Paulinho da Viola. O baluarte da Portela volta aos palcos cariocas no próximo dia 25. O cantor e compositor leva ao Circo Voador o seu novo show, “Na Madrugada”, em que revisita pérolas de seu vasto repertório que estavam de fora dos seus shows há um bom tempo. E assim o autor de versos como “Não sou eu quem me navega/Quem me navega é o mar” (“Timoneiro”) dará o devido destaque a canções outrora no baú de nossos afetos.

Entre essas canções pouco conhecidas, “O tímido e a manequim”, “Ruas que sonhei” e “Vela no breu”. Mas os sambas consagrados de sua obra como “Coração leviano”, “Dança da solidão”, “Eu canto samba”, “Onde a dor não tem razão”, “Recomeçar” e “Sinal fechado”.

Vamos aproveitar para rever uma apresentação histórica de Paulinho no Circo Voador, em 2012, durante o show comemorativo dos 30 anos da amada lona da Lapa. A canção é “Mora na filosofia”:

 

Paulinho aproveita a ocasião para prestar um tributo a seu pai, o violonista César farias, que teria completado 100 anos em 2019. Um dos grandes instrumentistas da MPB, César fez escola ao integrar o grupo Época de Ouro, uma referência do choro.

Foi justamente César Farias quem introduziu o jovem Paulo César no meio musical. Começou a tocar violão aos 15 anos, passando a frequentar as rodas de choro e samba organizadas pelo patriarca. “Mesmo ausente, meu pai está sempre presente nos meus shows, pois durante muito tempo fez parte do grupo que me acompanha. Agora, estamos celebrando o centenário dele. Foi um grande violonista. Meu filho João Rabello o substituiu, tocando o violão de seis cordas”, conta Paulinho cujo O apelido “da Viola” foi dado por Zé Kéti e pelo jornalista Sérgio Cabral, um dos grandes pesquisadores da música brasileira.

Portelense de coração, Paulinho sintetizou seu amor pela azul e branco de Oswaldo Cruz com um dos mais belos sambas já gravados e que tornou-se seu maior sucesso de todos os tempos: “Foi um rio que passou em minha vida” (1969). Curiosamente, o samba foi composto para apaziguar os ânimos de seus colegas de agremiação, enciumados com sua parceria com Hermínio Bello de Carvalho em “Sei lá, Mangueira”, gravada em seu álbum de estreia.

Por pouco, “Foi um rio que passou em minha vida” não virou o samba enredo da Portela no carnaval do 1970, mas foi acolhida de tal maneira pelos integrantes da escola que é cantada com entusiasmo em qualquer evento que envolva a Portela.

A discografia de Paulinho é vasta – são cerca de 60 álbuns – e, além de ser um exímio compositor, foi responsável por consagrar autores não reconhecidos ou pouco conhecidos ao incluir composições deles em seus discos. Entre eles, nomes como Cartola, Nelson Cavaquinho, Candeia, Wilson Batista, Jorge Mexeu, Catoni, Zorba Devagar e Walter Alfaiate.

Um belo tributo

Capa do CD “O amor é um segredo”, belo tributo de Zé Renato a Paulinho da Viola

Ao mesmo tempo em que homenageia seu pai, Paulinho também merece honrarias. A delicadeza e riqueza de suas letras e harmonias dão o ar da graça no álbum “O amor é um segredo – Zé Renato canta Paulinho da Viola”, que acaba de ser lançado pelo cantor que selecionou pérolas do repertório do portelense e carregou-as com sua voz leve e muito bem sibilada – uma de suas grandes características.

“Optei por nove sambas, boa parte deles não tão conhecidos. Nas escolhas que fiz, há também uma explícita dose de tristeza, tristeza que, a meu ver, percebe-se nos mais lindos sambas que conheço. A tristeza é senhora, disse Caetano”, compara, referindo-se a “Desde que o samba é samba”.

E para preservar essa aura “daviolesca” que Zé Renato gravou o disco em registro íntimo, com voz e violão gravados simultaneamente, sobre os quais alguns elementos pontuais foram inseridos, como o sax de Spok, em “Lua”, “Só o Tempo”, “Foi Demais” e “Para Um Amor no Recife”, o trompete de Fabinho Costa em “Cidade Submersa” e as percussões leves de Tostão Queiroga, presentes em quase todo o disco.

Confira a interpretação de Zé Renato para “Só o tempo”, apenas de Paulinho, no estúdio da Rádio Batuta:

Produzido pelo próprio Zé em parceria com os irmãos Tostão e Lula Queiroga, o álbum expõe uma linhagem que compreende a tristeza e a desilusão, mas que sempre consegue evocar a beleza e a delicadeza, outrora trazidas pelas próprias feridas da dor. “O único jeito é entregar-se sem resistência e deixar-se levar pela tristeza. E assim deixei. Paulinho é um dos maiores compositores brasileiros de todos os tempos. Faz tempo que suas músicas ajudam a embelezar o repertório de inúmeros intérpretes. E agora, modestamente, chegou a minha vez”, empolga-se Zé Renato.

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